A REVOLUÇÃO FRANCESA E ERA NAPOLEÔNICA
(1789-1815)
CRONOLOGIA BÁSICA
1774-1792 Reinado
de Luis XVI Bourbon
1787-1789 Revolta Aristocrática
1789, maio-junho
Assembleia dos Estados Gerais
1789, 17 junho Criação da Assembleia
Nacional
1789, 14 julho
Queda
da Bastilha
1789-1791 Assembleia Nacional Constituinte
1791-1792 Monarquia Constitucional
1792, abril
Início das Guerras Francesas (1792-1815)
1792, 10 agosto
Derrubada
da monarquia
1792-1795 Convenção
1793, 21 janeiro
Execução de Luis XVI
1793-1794 Governo
jacobino
1794, 27 julho Golpe do 9 Thermidor
1795-1799 Diretório
1799, 9-10 novembro
Golpe do 18 Brumário
1799-1804 Consulado
1804-1814
Primeiro
Império
1806, outubro
Bloqueio
Continental
1807, novembro
Invasão
francesa de Portugal
1808, fevereiro Invasão francesa da Espanha
1812, junho Invasão francesa da Rússia
1812, dezembro Retirada francesa da Rússia
1814, janeiro
Invasão aliada da França
1814, 30-31 março
Os Aliados
tomam Paris
1814, 6 abril
Abdicação de Napoleão I
1815, 1 março Retorno de Napoleão
1815, março-junho Os Cem Dias
1815, 22 junho
Abdicação de Napoleão
1815, 15 julho
Napoleão se
entrega aos britânicos
RESUMO
A Revolução Francesa (1789-1799) foi uma revolução burguesa
e popular (liberal e democrática) que destruiu o Antigo Regime francês, lançou
as bases para a construção da modernidade capitalista francesa e estimulou outros
movimentos revolucionários no Ocidente. No reinado de Luis XVI Bourbon
(1774-1792), o Antigo Regime entrou uma grave crise: problemas econômicos
e sociais (escassez, inflação, desemprego, avanço da pobreza, crescimento da dívida
pública), insatisfação popular, difusão do Iluminismo, ascensão da burguesia que
reivindicava mudanças e direitos políticos. A incapacidade de Luis
XVI em resolver essa crise, sobretudo pela resistência da aristocracia
conservadora em aceitar uma reforma tributária que acabaria com seus
privilégios e a forçaria a pagar impostos, agravou a situação. Uma Assembleia
dos Estados Gerais (representantes do clero, nobreza e povo) foi convocada para
deliberar sobre a reforma tributária, reunindo-se em maio de 1789. Os deputados
do Terceiro Estado, representante do povo, com apoio de deputados do clero e
nobreza reformistas, rebelou-se contra a forma de votação dos Estados Gerais e
formou uma Assembleia Nacional, apoiada pelo povo de Paris, em junho. Em 14 de julho de 1789, uma revolta
popular em Paris (cujo principal momento foi a tomada da fortaleza-prisão da
Bastilha), acompanhada do motim das tropas na capital, assegurou a
sobrevivência da Assembleia, ameaçada
de ser fechada por Luis XVI. Diante
da rebelião popular e a da impotência do rei, a assembleia foi transformada
numa Assembleia Nacional Constituinte
com a intenção de fazer reformas mais profundas inspiradas no Iluminismo. Uma
gigantesca revolução camponesa em julho-agosto de 1789, que tomou as terras da
nobreza e destruiu o regime senhorial na França, forçou a Assembleia a agir
mais rapidamente. Em 1789-1791, o absolutismo francês foi derrubado, os últimos
privilégios feudais e a servidão foram abolidos, a Igreja perdeu seu patrimônio
e ficou subordinada ao Estado. A Monarquia
Constitucional foi instalada em 1791 e Luis XVI foi mantido no trono com o
poder reduzido, mas a crescente crise econômica, a eclosão da guerra contra a
Áustria e Prússia (que acabaria envolvendo as outras potências e persistiria,
com breves tréguas, até 1815), a radicalização política e, principalmente, a resistência
de Luis XVI e a incapacidade dos grupos conservadores e liberais conseguirem um
compromisso, levou à derrubada da monarquia por uma insurreição popular em
Paris, liderada pelos republicanos (10 de agosto de 1792). Depois de executar
Luis XVI, uma nova assembleia constituinte (Convenção, 1792-1795) ampliou a guerra contra as demais potências europeias
(Grã-Bretanha, Espanha, Rússia), ao mesmo tempo em que enfrentava uma guerra
civil. Os republicanos extremistas (jacobinos),
liderados por Robespierre, assumiram
o poder e instalaram uma ditadura revolucionária (1793-1794), inicialmente
apoiada pelos sans-culottes
(trabalhadores urbanos), responsável pelo Terror
contra os adversários (execuções em larga escala). A mobilização militar em
massa foi instituída e um enorme exército foi criado. Os adversários internos
na guerra civil foram derrotados e as forças estrangeiras foram contidas e expulsas
da França. Em 1794, os moderados recuperaram o poder (execução de Robespierre)
e instalaram uma república liberal oligárquica "burguesa" (o Diretório, 1795-1799), mas os problemas
políticos internos e a guerra impediram a estabilização do regime republicano.
Em 1799, o general Napoleão Bonaparte
assumiu o governo no Golpe do 18
Brumário. De 1799 a 1814, Napoleão (imperador em 1804) consolidou a obra
revolucionária (secularização, centralização administrativa, Código Civil,
legislação pró-capitalismo) e estendeu, por meio da guerra, o domínio francês
por quase toda a Europa (o Império Europeu Napoleônico), sucumbindo, no final,
diante da resistência da Grã-Bretanha, Rússia, Áustria e Prússia. O impacto da
Revolução Francesa e da Era Napoleônica foi profundo e atingiu de tal forma as
estruturas sociais e políticas europeias que a levou a ser considerados o
símbolo do nascimento de uma nova época.
ESTUDO MAIS DETALHADO
INTRODUÇÃO
A natureza da Revolução Francesa, suas causas
e a questão se ela era inevitável ou não são motivos de debates até hoje.
Contudo, há uma visão predominante, que considera ter sido a Revolução Francesa
uma revolução burguesa, causada pelo choque entre os interesses
políticos e econômicos da burguesia em ascensão – fruto do desenvolvimento do
capitalismo francês – e as instituições e a legislação “feudais” do Antigo
Regime, isto é, o absolutismo, os privilégios da aristocracia, as
regulamentações econômicas etc. Nessa visão, o progresso do capitalismo na
França e a difusão das ideias iluministas tornavam o Antigo Regime
ultrapassado, transformando-o em obstáculo ao desenvolvimento de novas forças
produtivas (agricultura moderna, industrialização etc). A Revolução Francesa
destruiu esses obstáculos, abriu o caminho para a construção de um Estado
“burguês” e para a consolidação do capitalismo na França. Ela teria sido,
assim, a revolução política da burguesia francesa, a tomada do aparelho de
Estado por essa classe social e a transformação das instituições políticas e
jurídicas em benefício do capitalismo. Os que defendem essa interpretação,
porém, afirmam também que, embora a revolução tenha sido fundamentalmente
burguesa, ela não foi um movimento exclusivo da burguesia: ele serviu aos
interesses dos capitalistas, mas se desenvolveu pela ação das massas populares,
no caso pelos camponeses e pelos trabalhadores urbanos pobres. Esse aspecto de revolução
popular e democrática foi a principal característica da Revolução Francesa,
o que explica seu radicalismo político. Além disso, por ter sido um movimento
político com ideais universais, isto é, de estender seus objetivos libertadores
e igualitários por todo o mundo, a revolução assumiu um caráter internacional,
que “contagiou” outros países e provocou guerras do regime revolucionário
francês contra as todas as potências da Europa. Esses aspectos populares,
radicais e internacionalistas, aliados ao peso da França na política europeia,
deram uma forma particular à Revolução Francesa que só seria igualado em 1917
com a Revolução Russa.
A FRANÇA NA DÉCADA DE 1780
Na década de 1780, a França dividia com
a Grã-Bretanha o status de maior potência da Europa. Apesar de sua derrota na
Guerra dos Sete Anos, da perda de colônias e de um relativo atraso em relação
aos britânicos (que estavam iniciando a industrialização), o poderio francês
era enorme. Em superfície e população, ela superava as demais potências da
Europa Ocidental (o Sacro Império Germânico tinha uma população equivalente de
25 milhões de habitantes, mas era um Estado fragmentado na prática, sem poder
militar ou relevância política). Seu exército era o maior e mais temido do
Ocidente, sua marinha a segunda do mundo e sua produção manufatureira
continuava impressionante, só perdendo em produtividade para a britânica. Em
alguns aspectos seu comércio e sistema financeiro eram tão poderosos quanto os
britânicos e sua produção agrícola maior. O Estado francês, sob a direção da dinastia
Bourbon, era o símbolo do absolutismo europeu. O país era também o mais
influente em termos culturais, podendo-se falar em uma hegemonia cultural
francesa no Ocidente. A França era uma potência que estava tentando se
modernizar, principalmente para enfrentar os desafios impostos pela ascensão da
Grã-Bretanha.
Contudo, a França ainda vivia sob o Antigo
Regime que, na década de 1780, estava em decadência, em grande parte devido
à perda do prestígio da monarquia por causa da incompetência do rei Luis XV
(1715-1774), sobretudo na desastrosa política externa de confronto com a Grã-Bretanha.
Seu sucessor, Luis XVI (1774-1792), era um homem honesto e
bem-intencionado, mas seu caráter era por demais fraco e sua visão política
limitada para enfrentar os crescentes problemas da França, dirigir as reformas
necessárias para modernizar o país e solucionar a crise que atingiu seu reinado
nos anos de 1780.
MOTIVOS DA REVOLUÇÃO FRANCESA
A visão tradicional
A interpretação predominante considera que a
causa fundamental da Revolução Francesa foi a contradição entre o
desenvolvimento do comércio e indústria na França, resultando na emergência da
burguesia como um classe economicamente poderosa mas excluída do poder
político, e a permanência de instituições pré-capitalistas (“feudais”) do
Antigo Regime absolutista, dominadas por uma nobreza e clero decadentes. Os
obstáculos aristocráticos à participação política da burguesia e das camadas
populares, em uma conjuntura de crise econômica e de difusão das ideias
iluministas pelos “enciclopedistas”, criaram o clima de insatisfação, crítica e
oposição radical ao Antigo Regime. A opressão exercida pelo Estado, Igreja e
nobreza sobre os camponeses que, com seu trabalho e impostos sustentavam o
Antigo Regime, e o agravamento da pobreza entre os trabalhadores urbanos,
forneceram a matéria-prima para a explosão de levantes das massas, instigadas
por ideias radicais, contra a ordem existente.
Problemas do
reinado de Luis XVI (1774-1792)
No reinado de Luis XVI, uma série de
problemas, alguns herdados do governo anterior e outros combatidos de maneira
ineficiente em sua administração, ampliaram a insatisfação geral e aumentaram
as críticas, sobretudo dos iluministas radicais, ao Antigo Regime.
A crise financeira. As despesas do
Estado eram muito superiores a receita, a dívida pública era o dobro do meio
circulante no país e era impagável com os recursos disponíveis, e o governo não
conseguia mais empréstimos dos banqueiros nacionais e estrangeiros. O que mais
contribuiu para quebrar as finanças do Estado foram as despesas militares
– o alto custo da Guerra dos Sete Anos (1756-1763) e da intervenção francesa a
partir de 1778 na Guerra de Independência Americana (1774-1783), além dos
gastos com a modernização das forças armadas nos anos de 1780. Mas os gastos da
Coroa com o luxo da família real e da nobreza ociosa que vivia no Palácio de
Versalhes acabou se transformando no símbolo do desperdício e do descaso
financeiro do regime.
O fracasso das reformas governamentais. Durante o
reinado de Luis XVI, diversos ministros das finanças (Turgot, 1774-1776;
Necker, 1776-1783; Calonne, 1783-1787; Brienne, 1787-1788;
Necker, novamente, 1788-1789), de formação iluminista fisiocrata,
tentaram em vão aplicar planos de reformas modernizadoras – abolição dos
direitos feudais e das guildas, tributação mais eficiente, taxação da nobreza e
do clero. Um a um esses ministros e seus sucessores abandonaram o cargo devido
a pressão e resistência da aristocracia e da pequena nobreza empobrecida, que
não aceitavam perder seus privilégios. A própria rainha Maria Antonieta,
impopular e um dos alvos preferidos dos críticos radicais do regime, foi uma
influente voz contrária as reformas.
O Tratado Comercial com a Grã-Bretanha
(1786).
Diminuiu os preços das manufaturas importadas da Grã-Bretanha, prejudicando a
indústria francesa, sobretudo as de tecidos populares. A concorrência
estrangeira reduziu as vendas de produtos nacionais, arruinando fábricas e
oficinas artesanais.
As más colheitas de 1787-1788. Geraram uma
crise de abastecimento, com escassez e elevação do preço do pão, aumentando a
fome e a miséria da população pobre.
Influência da Revolução Americana
(1775-1787).
Não apenas com a difusão das ideias iluministas sobre as tropas francesas que
participaram da luta contra os britânicos ao lado dos americanos, mas também
com o modelo de Estado liberal criado, em parte inspirado nas concepções
políticas dos próprios iluministas franceses. Em todos os cantos surgiam
clubes, salões e lojas maçônicas de simpatizantes e adeptos do Iluminismo e de
governos constitucionais liberais, baseados no exemplo republicano americano ou
no modelo monárquico parlamentar britânico.
O INÍCIO DA
REVOLUÇÃO FRANCESA (1787-1789)
A Revolta
Aristocrática contra a reforma fiscal (1787-1788)
Com o agravamento da crise financeira e o
crescimento da insatisfação popular, a reforma fiscal apresentava-se como única
solução para recuperar as finanças reais. O ministro Calonne propôs cobrar
impostos da nobreza e do clero, até então isentos. O absolutismo francês não
tinha poder para tanto e precisava do consentimento da aristocracia, a camada
social que dava mais sustentação a monarquia. Luis XVI, portanto, se viu
forçado a convocar corpos representativos da classe dominante (que não eram convocados
desde o século XVII) para convencê-la a aceitar a eliminação de seus
privilégios fiscais e pagar impostos, como a maioria dos súditos era obrigada a
fazer.
A Assembleia
dos Notáveis (fevereiro-maio 1787). Os
“Notáveis” eram aristocratas que desfrutavam da confiança do rei. Sua
assembleia não era convocada desde 1626. Reunida, rejeitou as propostas para
combater o déficit. Em abril, Luis XVI destituiu Calonne, substituindo-o por
Brienne, que manteve a proposta anterior.
O Parlamento
de Paris (novembro 1787 – maio 1788). Em um clima de grande agitação popular, também recusou a reforma fiscal e
exigiu a convocação da Assembleia dos Estados Gerais, órgão consultivo das três
ordens feudais – clero, nobreza e povo.
Acuado e vendo a sua base de sustentação
política diluir em meio ao crescimento das agitações populares, Luis XVI foi
obrigado a convocar a assembleia suprema do reino – uma convocação que o
absolutismo conseguira evitar por mais de 170 anos. Com isso, a aristocracia
enfraqueceu mais ainda a monarquia absolutista, rompendo o sistema tradicional
de poder. A decisão da convocação foi feita em agosto de 1788, seguida pela
destituição de Brienne por Turgot.
A reunião dos
Estados Gerais e a criação da Assembleia Nacional (1789)
A estrutura estamental da sociedade francesa. Em 1789, a sociedade francesa
do Antigo Regime era dividida em ordens ou estados:
– O Primeiro Estado: formado
pelo clero (cerca de 120 mil membros).
– O Segundo
Estado: formado pela nobreza (cerca de 350 mil pessoas)
– O Terceiro
Estado: formado pelo “povo”, isto é, os não-aristocratas, como a burguesia,
camponeses e trabalhadores urbanos (mais de 24 milhões de pessoas, 85 %
camponeses)
A origem dessa estrutura social remontava à
Idade Média, com a divisão da sociedade feudal em sacerdotes, guerreiros e
trabalhadores. A Assembleia dos Estados Gerais era um órgão consultivo
com representantes dos três estados. Ela possuía a atribuição da votação dos
impostos propostos pelo rei e era convocada em épocas de emergência e crise
financeira. Antes de 1789 tinha sido convocada pela última vez em 1614. No
segundo semestre de 1788, o ministro Necker, com apoio da nobreza liberal,
partidária de reformas, conseguiu que o número de deputados do Terceiro Estado
fosse duplicado (578), superando o conjunto dos representantes do Primeiro
(291) e Segundo Estados (270). Mas como a votação era por estado e não por
cabeça, clero e nobreza, votando juntos garantiriam à aristocracia o controle
sobre as decisões. As eleições para a Assembleia dos Estados Gerais ocorreu
entre novembro de 1788 e fevereiro de 1789 em um clima de agitação fora do
comum e publicação de numerosos panfletos de caráter revolucionário,
destacando-se o do Abade Sieyès, “O Que é o Terceiro Estado?”,
onde pregava a ideia de que o Terceiro Estado era o único e legítimo
representante do povo.
A instalação da Assembleia dos Estados Gerais. Em 4 de maio
de 1789, a Assembleia dos Estados
Gerais reuniu-se em Versalhes em meio a violentos distúrbios populares nas
cidades e no campo, causados pela escassez, elevação dos preços e fome. Formaram-se
dois grandes agrupamentos políticos: os “patriotas” ou “Comuns”,
constituído pelo Terceiro Estado, pela nobreza liberal e pelo clero reformista,
defensores da votação individual (por cabeça), que daria a eles o controle da
Assembleia possibilitando a aprovação de reformas; e os “aristocratas”, com
a maioria do Primeiro e Segundo Estados, que exigiam a votação por estado, para
que pudessem dominar a Assembleia e impedir as reformas.
A rebelião do Terceiro Estado (junho-julho
1789). Em
17 de junho de 1789, o Terceiro Estado, por proposição do abade Sieyès, se
constituiu em Assembleia Nacional, presidida por Jean-Sylvain Bailly, líder dos Comuns, única representante
legítima do povo francês. Em 18-25 junho 1789, a maior parte dos deputados do
clero e dissidentes da nobreza aderiram à Assembleia Nacional na condição de
“Comuns”, mas a maioria dos nobres continuou resistindo. Necker propôs ao
Conselho Real uma ampla reforma política e tributária, rejeitada. O rei reagiu
contra o Terceiro Estado mandando fechar o salão onde ele se reunia. Os Comuns
mudaram-se, então, para outra sala e juraram não se separar até a elaboração de
uma constituição (“Juramento do Jogo da Pela”, 20 junho). Era, na prática, o
começo da revolução.
A reação de Luis XVI. Inicialmente,
Luís XVI fingiu aceitar a Assembleia Nacional e orientou os “aristocratas” a
unirem-se ao Terceiro Estado. Em um sessão no salão dos Estados-Gerais (23
junho), propôs reformas limitadas, aquém das sugeridas pelos Comuns, entrando
em confronto com eles. Simultaneamente, procurou ganhar tempo para mobilizar
suas tropas, fechar a Assembleia Nacional e reprimir a revolução no nascedouro.
Em 11 de julho, o rei demitiu Necker, substituindo-o por Breteuil. Nos dias
seguintes, o movimento das tropas em Paris e a notícia da demissão de Necker
assustaram a Assembleia Nacional e levaram os radicais e os agitadores a
mobilizar a população, que passou a procurar armas.
A Queda da Bastilha (1789)
No dia 14 de julho de 1789, um enorme
multidão (40 a
50 mil pessoas) tomou a fortaleza dos Inválidos e se apossou de milhares de
fuzis. No acontecimento decisivo do dia, as tropas aquarteladas nas
proximidades recusaram enfrentar o povo que, sem ninguém para detê-lo, avançou
para a prisão da Bastilha, símbolo do despotismo, para tomar a munição
lá depositada. Com a ajuda de soldados amotinados, a multidão invadiu a
Bastilha, libertou os poucos presos que estavam encarcerados e massacraram a
guarnição local. Esse fato – a mobilização do povo armado e o motim das tropas
– salvou a Assembleia Nacional de ser fechada e simbolizou o início da
Revolução Francesa. Consequências:
– Colapso da administração pública e do
exército real;
– Expansão da revolução pelo país;
– Criação de milícias armadas de cidadãos
(camadas médias, burgueses) para manter a ordem: a Guarda Nacional, comandada
pelo nobre liberal Marquês de La Fayette;
– Estabelecimento de conselhos municipais
autônomos (as Comunas, controladas pela burguesia);
– Início da fuga da aristocracia para os
países vizinhos (nobreza “emigre”)
A ASSEMBLEIA
NACIONAL CONSTITUINTE (1789-1791)
Com o colapso do
absolutismo, o poder de fato foi transferido para a Assembleia Nacional, que
assumiu feições constituintes. A principal liderança da revolução nesse momento
foi o Conde de Mirabeau, um nobre liberal (morreu em abril de 1791, uma
morte que reduziu a influência dos moderados no curso da Revolução). O plano
inicial dos revolucionários não era eliminar a monarquia, mas reformar o regime
francês criando um legislativo forte e independente. O rei Luis XVI foi mantido
no trono. Mas enquanto a Assembleia Nacional tentava assumir o controle da situação,
com os Comuns buscando um compromisso com os Aristocratas, a revolução popular
ficou incontrolável e se expandiu.
A Revolução
Camponesa (julho-agosto 1789). No meio rural,
espalhou-se o rumor de uma conspiração contrarrevolucionária da aristocracia,
que estaria supostamente armando bandos de salteadores. A notícia falsa gerou
entre os camponeses o fenômeno do Grande Medo ou Grande Pânico e eles acabaram
formando milícias aldeãs armadas. Os assaltantes não foram encontrados, mas os
camponeses armados, sem nenhuma força repressora para detê-los, passaram a
atacar os castelos, destruíram os documentos dos registros dos direitos feudais
e tomaram várias terras. Na prática, a Revolução Camponesa tinha se adiantado à
Revolução Burguesa na destruição do regime senhorial francês, que existia há
mil anos.
A Abolição do Regime Feudal (4-11 agosto
1789). Para
acalmar os camponeses, a Assembleia Nacional decidiu em uma votação histórica
abolir os direitos feudais, libertar os servos, acabar com os dízimos e instalar
a igualdade perante os impostos. Na verdade, apenas alguns direitos feudais
foram abolidos imediatamente; os outros deveriam ser negociados mediante
indenização (acabaram extintos definitivamente em 1793).
A Declaração
dos Direitos do Homem e do Cidadão (26 agosto 1789). Aprovada pela Assembleia Nacional baseou-se
na Bill of Rights dos EUA e na tradição britânica de direitos, mas
distinguiu-se por se pretender mais universal. Dizia que a nova ordem social (a
igualdade diante da lei, a liberdade de opinião e expressão, o direito de
propriedade, a resistência à opressão, a soberania baseada na Nação, o respeito
pela ordem pública) era fruto de direitos naturais e sagrados e, portanto,
deveria ser aplicada a toda a humanidade. A Declaração Francesa serviu de base
para a Declaração Universal dos Direitos Humanos adotada pela ONU em 1948.
A nacionalização
dos bens do clero (2 novembro 1789). Visando suprimir o déficit público, os bens do clero foram confiscados
(“postos à disposição da Nação”), seguindo uma proposta de Talleyrand, bispo de
Autun. O Estado assumiria as despesas do culto, do pagamento do salário do
clero, da manutenção dos asilos e da ajuda aos pobres. Com a secularização das
propriedades da Igreja, as terras eclesiásticas foram vendidas para garantir a
emissão dos assignats (títulos públicos) para o pagamento da dívida do
Estado. Isso gerou uma grande inflação, piorando as condições de vida da
população.
A Constituição Civil do Clero (12 julho
1790). A
Igreja Católica ficou totalmente subordinada ao Estado: o número de bispos e de
paróquias foi reduzido sem consultar o papa, o clero passaria a ser eleito
pelas assembleias locais (inclusive por não católicos) e se tornaria
funcionário público, pago pelo Estado e devendo juramento “à nação, à lei e ao
rei”. Essa medida desagradou a Igreja, dividiu o clero e foi condenada pelo
papa Pio VI, que passou a hostilizar a revolução.
Decreto de liberdade econômica (2 março
1791).
Aprovada pela Assembleia Nacional, suprimiu os monopólios das corporações de
ofício, estabelecendo a total liberdade comercial e industrial dentro da
França. Mas, no mesmo mês, foi decidido manter o pacto-colonial com as colônias
francesas.
Lei Le
Chapelier (14 junho 1791). Extinguiu as corporações de ofício e
confirmou a proibição de sindicatos de trabalhadores e de greves.
O início da contrarrevolução. Enquanto a
crise econômica crescia e junto com ela a desilusão e insatisfação popular com
a Assembleia, a aristocracia mais conservadora conspirava para restabelecer
seus antigos privilégios. A nobreza emigrada, liderada pelo irmão de Luis XVI,
o Conde de Artois (futuro Carlos X), e reunida em Coblença, na Alemanha,
buscava o apoio das potências estrangeiras, principalmente da Áustria (Maria
Antonieta era uma Habsburgo, irmã dos reis austríacos e imperadores do Sacro Império
Germânico José II, 1765-1790, e Leopoldo II, 1790-1792). Na época, a Bélgica
pertencia à Áustria e podia servir de base para uma invasão da França. Em abril
de 1791, uma multidão impediu que a família real saísse da capital para passar
a Páscoa em Saint-Cloud, nas vizinhanças de Paris, comprovando que o rei era,
de fato, prisioneiro do povo parisiense. A partir desse momento, Luis XVI e os
emigrados passaram a articular sua fuga da França para se juntar aos
aristocratas em Coblença e comandar a contrarrevolução com ajuda estrangeira.
Em 20-21 de junho de 1791, Luis XVI e sua família fogem de Paris, escondidos,
mas são descobertos e detidos na fronteira, em Varennes. Forçados a
retornar para a capital, sob escolta, foram recebidos com grande hostilidade
pelos parisienses. A monarquia perdeu o que restava de sua autoridade e passou
a ser vista como inimiga da revolução. A expectativa de que havia uma
conspiração contra a França revolucionária envolvendo a nobreza conservadora, a
Igreja e as potências absolutistas parecia se confirmar em 27 de agosto de 1791
com a Declaração de Pillnitz, na
qual os monarcas Leopoldo II da Áustria e Frederico Guilherme II da Prússia
advertem os soberanos europeus a agirem com urgência contra a Revolução
Francesa se solicitados. A declaração aumentou a tensão entre partidários e
adversários da Revolução, e entre a França e seus vizinhos absolutistas.
A Constituição de 1791. Apesar de
desacreditada, a monarquia foi mantida pelos deputados da Assembleia Nacional,
que consideravam a república uma alternativa por demais radical e perigosa. Em
13-14 setembro 1791, Luis XVI, enfraquecido e sem opção, promulgou a Constituição de 1791, que estabelecia
um regime liberal com uma monarquia limitada por um legislativo eleito pelo
voto censitário ( a Assembleia Legislativa Nacional ).
A MONARQUIA
CONSTITUCIONAL ( 1791-1792)
Em 1 de outubro 1791, iniciaram-se as sessões
da Assembleia Legislativa Nacional. Ela era mais revolucionária do que a
Assembleia Constituinte, não possuía adeptos do Antigo Regime e dividia-se em
três grandes agrupamentos:
– Direita: com
264 deputados, estavam os feuillants, defensores da Monarquia
Constitucional.
– Centro: com 345
deputados de um grupo de indecisos, que oscilavam entre a esquerda e a direita.
– Esquerda: com
136 deputados, muitos favoráveis à radicalização da revolução e de tendência
republicana. A esquerda acabou se subdividindo em brissotins (liderados
pelo deputado e advogado Jacques Pierre Brissot, mais tarde
dariam origem aos girondinos) e em jacobinos.
Todavia, o novo regime francês nascia
envolvido em profundos problemas que cresceram entre outubro de 1791 e março de
1792. A
crise econômica só piorava, a população estava cada vez mais insatisfeita, os
radicais republicanos aumentavam a agitação contra a monarquia e o movimento contrarrevolucionário
dos emigres contava com crescente apoio da Áustria e Prússia. Sob a iniciativa
de Brissot, a Assembleia lançou uma série de decretos contra os nobres
emigrados (exigência de seu retorno à França, confisco de seus bens). A guerra
contra as potências absolutistas passou a ser considerada inevitável e
desejável pelos brissotins (girondinos): além de enfrentar a contrarrevolução
que ameaçava o novo regime, serviria para distrair a atenção da população. Em
25 de março, a França enviou um ultimato à Francisco II, o novo monarca
Habsburgo do Sacro Império Germânico e da Áustria (1792-1835), intimando-o a
repatriar os emigrados franceses. O rei austríaco não respondeu e, em 20 de
abril de 1792, a Assembleia propôs a Luis XVI que declarasse guerra
a Francisco II, proposta que ele acatou imediatamente, acreditando que a França
seria derrotada, a Assembleia destruída e o absolutismo restaurado. A Prússia,
aliada da Áustria também entrou em guerra contra a França.
A Primeira
Guerra da Coalizão (1792-1797). A guerra iniciada
em 1792 foi
o início das Guerras Revolucionárias
Francesas (1792-1815), um longo
conflito de 23 anos entre a França e as potências europeias, que mudou para
sempre a história do continente. Com efeito, essas guerras podem ser vistas
como o episódio final e decisivo das tentativas francesas de estabelecer sua
hegemonia na Europa, em uma luta contra a Grã-Bretanha, Áustria, Prússia,
Rússia e outras potências. Mas elas também tiveram um outro significado, mais
importante para o nascimento do mundo contemporâneo: elas radicalizaram a
revolução dentro da França ao mesmo tempo em que a exportaram para os outros
países, internacionalizando o movimento revolucionário contra o Antigo Regime.
Guerra e revolução viraram sinônimos nesses anos.
A crise militar e política francesa. A Primeira
Guerra da Coalizão começou mal para a França, que acabou sendo invadida pelos
exércitos da Áustria e da Prússia., animando os contrarrevolucionários. Luis
XVI, que esperava a derrota dos franceses, vetou os decretos da Assembleia que
buscavam organizar a defesa do país. Em 28 julho 1792, o comandante do exército
austro-prussiano, Duque de Brunswick, lançou o Manifesto de Brunswick
ameaçando a população de Paris se a família real sofresse algum ultraje e Luis
XVI não recuperasse toda a autoridade. Ao invés de intimidar os parisienses,
esse decreto só serviu para aumentar o ódio popular contra a monarquia e os
contrarrevolucionários. Os radicais, partidários da república, ganharam força e
mais influência.
A queda da monarquia (agosto-setembro 1792). Em 10 de agosto
de 1792, estourou uma nova revolução popular em Paris, precipitada pela
guerra e pelo Manifesto de Brunswick. Os grupos radicais, destacando-se os
jacobinos, mobilizaram o povo, organizaram a Comuna Insurrecional e
levaram uma multidão a tomar o Palácio das Tulherias. Luis XVI e a família
real foram aprisionados, a Comuna (dirigida pelos jacobinos) assumiu o
poder em Paris e pressionou a Assembleia a convocar uma Convenção eleita
pelo sufrágio universal (uma nova assembleia constituinte). Entretanto, em
agosto-setembro os exércitos austros-prussianos avançaram no norte da França,
deixando Paris em pânico. A Comuna (jacobinos) e a Assembleia entram em choque,
com a primeira exigindo medidas repressivas contra os suspeitos de contrarrevolução.
Temendo uma ação dos contrarrevolucionários na capital, em 2-5 de setembro de
1792 o povo, instigado pela Comuna e por radicais como o jornalista Marat,
invadiu as prisões e matou os prisioneiros contra-revolucionários (os Massacres
de Setembro). Porém, o fato decisivo para salvar o regime revolucionário
foi a Batalha de Valmy (20 setembro), quando o exército francês, sob o
comando do general Dumouriez, derrotou os prussianos e deteve o avanço
dos contrarrevolucionários. No mesmo dia, a Assembleia Legislativa foi
dissolvida e substituída pela Convenção Nacional, presidida pelos
girondinos. Em 21 de setembro, ela aboliu a monarquia.
A CONVENÇÃO NACIONAL (1792-1795)
A república foi proclamada em setembro de
1792 pela Convenção Nacional, a assembleia constituinte com a missão de
elaborar uma nova constituição para substituir a de 1791.. Durante os três anos
de sua existência ela exerceu ao mesmo tempo o poder executivo e legislativo.
Seus membros foram eleitos pelo voto universal masculino, mas 90 % dos
eleitores abstiveram-se de votar. Sua representação era majoritariamente
republicana e “burguesa”, dividindo-se em:
Girondinos. A “direita” (na assembleia anterior eram os
brissotins, parte da “esquerda”) , com uns 150 deputados, em sua maioria da
grande burguesia comercial, financeira e manufatureira das províncias.
Defensores do liberalismo, eram contrários ao radicalismo dos parisienses e às
medidas de intervencionismo estatal, de tributação excessiva e de ameaça à propriedade.
Principais representantes: Brissot, Vergniaud e Roland.
Montanha. A “esquerda”, também com aproximadamente 150
deputados, a maioria de jacobinos. Representavam a média e pequena
burguesia (profissionais liberais, pequenos empresários, jornalistas,
advogados), mais sensível aos problemas e demandas populares. Tinham o apoio da
Comuna de Paris e eram favoráveis às medidas radicais e drásticas para conter a
crise econômica e a contrarrevolução. Principais líderes: Robespierre,
Danton, Marat e Saint-Just.
Planície ou Pântano. O “centro”,
com cerca de 300 deputados, eram republicanos moderados, oscilando entre o
apoio à direita e à esquerda, servindo, portanto, de árbitros entre os
extremos. Principais representantes: Sieyès e Cambacéres.
Fora da Convenção Nacional, uma outra força
política de peso em Paris eram os sans-culottes, as camadas populares
urbanas formadas pelos artesãos, lojistas, pequenos comerciantes e assalariados
pobres. Seus ideais eram considerados radicais porém vagos e contraditórios:
defesa da pequena propriedade privada contra os ricos; trabalho e segurança no
emprego para os pobres garantidos pelo governo; democracia com participação
popular; igualdade política e liberdade para todos. No entanto, eles foram a
principal força da Revolução em 1792-1793 e eram representados pelos grupos
políticos da extrema-esquerda: os cordeliers (com Hébert e Marat)
e os enragés ou “enraivecidos” (com Jack Roux e Leclerc).
A Convenção Girondina (1792-1793)
Entre setembro de 1792 e junho de 1793, os
girondinos dominaram a Convenção com apoio da planície. Mas o poder na prática
ficou dividido entre ela e a Comuna de Paris, que continuou funcionando. A
guerra prosseguia e determinou as diretrizes da política interna.
A ofensiva francesa (setembro 1792 – março
1793). As
tropas francesas expulsaram os exércitos austro-prussianos da França e
invadiram a Bélgica e a Alemanha. Em novembro de 1792, a Convenção declarou
que a França ajudaria todos os povos que desejassem se libertar da opressão –
era o início da campanha de expansão revolucionária contra os regimes
absolutistas da Europa, que acabaria se transformando em uma guerra
imperialista de conquista visando estabelecer o domínio francês sobre o continente.
De fato, a Savóia e Mônaco foram anexadas á França.
A execução de Luis XVI
(21 janeiro 1793). Paralelamente aos triunfos militares, foi
feito o julgamento do rei, acusado de traição. Apesar da oposição girondina, os
jacobinos, apoiados pela Comuna e pelos sans-culottes, conseguiram condena-lo à
morte, executado na guilhotina. O regicídio chocou a Europa – a execução do rei
foi, na verdade, um desafio do governo revolucionário aos monarcas europeus – e
dividiu os franceses profundamente (os camponeses condenaram a medida, enquanto
os parisienses a aprovavam).
A expansão da guerra. As conquistas e anexações francesas, as agitações revolucionárias
na Europa e a execução de Luis XVI tornaram inevitável o envolvimento das
outras potências no conflito da Áustria, Prússia e Império Alemão contra a
França. A Convenção tomou a iniciativa de declarar guerra à Grã-Bretanha
e Holanda (fevereiro) e à Espanha (março), levando a formação de
uma grande aliança antifrancesa. Diante da superioridade dessa coalizão,
os franceses perderam os territórios conquistados na Bélgica e Alemanha e a
França ficou novamente ameaçada de invasão. Em fevereiro, a Convenção decretou
o recrutamento de 300 mil homens para reforçar o exército, mas sua efetivação demorou
por não precisar como isso seria feito.
Criação do Tribunal Revolucionário (março 1793). Estabelecido pela Convenção, era
chamado originalmente de Tribunal Criminal Extraordinário (em outubro é que foi
denominado “Revolucionário”). Era uma corte para julgar, sem apelação, os crimes
de contrarrevolução, isto é, contrários ao regime revolucionário – crimes
contra a República, a soberania popular, o Estado democrático, a liberdade e
igualdade ou a favor da monarquia, segundo a interpretação da Convenção. O
Tribunal acabou se transformando em um instrumento de uma violenta repressão
praticada pela liderança revolucionária contra qualquer adversário, real ou imaginário,
monarquista ou republicano rival.
A Revolta da Vendéia (1793-1795). Em março de
1793, eclodiu uma insurreição dos camponeses da região da Vendéia contra as
medidas revolucionárias (recrutamento em massa) que ameaçavam as tradições e o
modo de vida da população local. A revolta assumiu uma feição monarquista e
clerical, de camponeses tradicionalistas insatisfeitos com as medidas radicais,
republicanas, seculares e regicidas do governo revolucionário, fortalecendo,
assim, a contrarrevolução. O resultado foi uma sangrenta guerra civil que durou
dois anos, fazendo 400 mil vítimas.
A queda dos girondinos (junho). A oposição
aos girondinos cresceu com o aumento da crise econômica, agravada pela ameaça
estrangeira e pela contrarrevolução. A crise piorou quando, em março, o general
Dumouriez, acusando a Convenção de uma política externa desastrosa responsável
pelas dificuldades militares da França, tentou levar seu exército para tomar
Paris e dissolver a assembleia revolucionária. O golpe militar, entretanto,
fracassou, porque a maior parte das tropas recusou seguir o general. Dumouriez,
com parte dos oficiais, passou, então, para o lado dos austríacos (abril). A
“traição” de Dumouriez enfraqueceu os girondinos, seus amigos. Em abril, os
montanheses estabeleceram o Comitê de Salvação Pública encarregado de
dirigir a defesa do país e o combate à contrarrevolução. O conflito entre os
jacobinos e girondinos acirrou-se em maio quando a Gironda criou uma comissão
que tentou fazer uma sindicância nos atos da Comuna de Paris (dominada pela
esquerda) e mandou prender o líder extremista Hébert. A Comuna, apoiada pelos
sans-culottes, reagiu organizando um Comitê Insurrecional para tomar o poder,
conseguindo assumir o controle da Guarda Nacional (31 maio). Em 2 de junho, a
Guarda Nacional e os sans-culottes, liderados pelos jacobinos, tomaram a
Convenção e prenderam alguns deputados girondinos. Com apoio da planície, os
jacobinos assumiram a direção da Convenção Nacional.
A Convenção Montanhesa ou Jacobina (1793-1794)
Na interpretação predominante da Revolução
Francesa, a Convenção Jacobina foi uma aliança da burguesia com os trabalhadores
urbanos, sobretudo os sans-culottes. Foi a fase mais radical e popular da
Revolução, uma radicalização aceita pela burguesia como uma solução emergencial
para salvar a obra revolucionária, ameaçada pela contrarrevolução, guerra civil
e invasão estrangeira. A direção do país ficou com o Comitê de Salvação Pública,
onde se destacaram os jacobinos Robespierre, Danton e Saint-Just. Os jacobinos
instalaram uma ditadura de esquerda que, nesse sentido, atendeu aos interesses
revolucionários da burguesia.
A expansão da guerra civil. A queda e prisão dos girondinos desencadeou
uma rebelião nas províncias contra a Convenção Jacobina – o Movimento
Federalista, que se juntou à Revolta da Vendéia.
A ditadura jacobina. O Comitê de
Salvação Pública adquiriu poderes ditatoriais para “salvar a Revolução e
garantir a liberdade”. Sua figura mais importante foi Robespierre.
Principais medidas: (I) alistamento militar em massa; (II) intervenção governamental
no mercado com o estabelecimento de um preço máximo para as mercadorias e
salários ( o “máximo dos preços”); (III) eliminação sem indenização dos últimos
direitos feudais; (IV) confisco das terras dos contrarrevolucionários; (V)
abolição da escravidão nas colônias; (VI) ampliação da secularização ou “descristianização”
do país e adoção de um novo calendário, com a “Era Republicana” começando em
1792 (o Ano I) e os novos nomes para os meses (vendemiário, brumário, termidor
etc).
A recuperação militar. O recrutamento
em massa criou um gigantesco exército que chegou a possuir 1 milhão de
soldados. Os antigos comandantes foram substituídos por indivíduos que se
destacavam no campo de batalha, dotados de iniciativa e audácia e que
empregavam novas táticas. No final de 1793, os franceses expulsaram os
exércitos da Coalizão e invadiram novamente os países vizinhos. A Bélgica e a
Renânia (margem esquerda do Reno, na Alemanha) foram anexadas.
O Terror Jacobino. Foi a política de repressão da ditadura jacobina contra os
inimigos da revolução e contra os adversários políticos pertencentes a outras
facções revolucionárias. Seu principal instrumento foi o Tribunal
Revolucionário, que julgava os opositores do regime. Cerca de 40 mil
pessoas foram executadas, sem contar os mortos da Revolta da Vendéia. Muitos
monarquistas e girondinos foram mortos mas, ironicamente, a maior parte das
vítimas era de sans-culottes, inclusive os líderes “enraivecidos” e cordeliers,
que exigiam do Comitê de Salvação Pública uma maior radicalização da revolução
e reformas econômicas em benefício dos trabalhadores. Um grupo de jacobinos moderados
(os “Indulgentes”), que defendiam o fim da ditadura e a paz com a Grã-Bretanha,
também foi executado, inclusive Danton, acusado de traição (abril 1794).
Os dilemas dos jacobinos. A ditadura
jacobina, com suas medidas radicais e execuções em larga escala, salvou a
Revolução do colapso. Contudo, essas medidas, os excessos do governo e as restrições
à liberdade econômica levaram os jacobinos a perder apoio das camadas populares
e da burguesia. O grupo jacobino se dividiu e a facção de Robespierre passou a
governar sufocando qualquer dissidência e oposição, o que o deixou isolado e
enfraquecido.
O Golpe do
9 Thermidor. Derrubada dos jacobinos pela planície e pelos girondinos. .No
dia 27 de julho de 1794, os deputados oposicionistas conseguiram que a Convenção
aprovasse a prisão de Robespierre, Saint-Just e outros jacobinos, que foram
executados sem julgamento. Nos dias seguintes, seus correligionários foram
também mortos.
A Convenção Thermidoriana (1794-1795)
O governo termidoriano (a “Reação Thermidoriana”)
era formado pela planície e pelos girondinos e tinha o objetivo de eliminar o
radicalismo da obra jacobina, retornar ao liberalismo e elaborar uma nova
constituição.
Terror Branco. Perseguição e
assassinato de jacobinos e seus simpatizantes.
Liberalização da economia. Suspensão do
máximo de preços, abolição dos decretos de distribuição de alimentos etc.
Acordos de paz. Com a
Prússia, Espanha e Holanda, embora a guerra continuasse contra a Grã-Bretanha,
Áustria e Rússia.
Constituição de 1795. Criação de
uma república liberal, com o restabelecimento do voto censitário e abolição dos
direitos sociais da Constituição anterior. O poder executivo era formado pelo
Diretório, composto por 5 membros nomeados pelo legislativo.
O DIRETÓRIO (1795-1799)
O Diretório foi uma república liberal
oligárquica, ou “burguesa”, que tentou consolidar a obra revolucionária.
Contudo, a continuação da guerra, o caráter não democrático do regime e a
oposição dos monarquistas impediram que o regime liberal conseguisse a
estabilidade política. Uma série de conspirações e tentativas de golpes
marcaram o período e transformaram o exército, comandado por uma nova geração
de jovens oficiais revolucionários, na principal base de sustentação do regime.
Destaques:
A Conspiração dos Iguais (março-maio 1796). Liderada por Gracchus
Babeuf, foi um movimento da extrema-esquerda, a primeira tentativa de
implantar um regime comunista moderno na história. Babeuf defendia a eliminação
da propriedade privada e a criação de uma sociedade coletivista. O movimento
foi descoberto e Babeuf preso e executado.
Expansão militar francesa. Sob o comando
do general Napoleão Bonaparte, na Itália (1796-1797) e no Egito (1798-1799). A
Áustria aceitou a paz (outubro 1797). Napoleão se transformou no principal e
mais popular comandante militar da França.
Expurgos políticos na oposição. Prisão e
expulsão de monarquistas e de jacobinos
Problemas do Diretório. Dificuldades
constitucionais (executivo muito subordinado ao legislativo que, ao ser
renovado, mudava o governo, criando uma forte instabilidade), ampliação da
guerra (formação da Segunda Coalizão Antifrancesa em 1799 com a Grã-Bretanha,
Rússia, Império Turco e novamente a Áustria) e ofensiva sobre os franceses na
Itália e Alemanha. Diante desse quadro de nova ameaça externa e instabilidade
interna os membros do próprio Diretório (Sieyés, Roger Ducos e Barras) conspiraram
com Napoleão Bonaparte a derrubada do governo, em nome da paz, estabilidade e
da reforma constitucional.
O Golpe do 18 Brumário. No dia 9 de
novembro de 1799, sob o pretexto de impedir um suposto complô jacobino,
Napoleão Bonaparte derrubou o Diretório e assumiu o poder.
O
PERÍODO NAPOLEÔNICO (1799-1815)
CARACTERÍSTICAS GERAIS
O período de mais de duas décadas em que Napoleão
Bonaparte governou a França foi caracterizado por dois fatos essenciais: a
consolidação da obra econômica, jurídica e administrativa da Revolução Francesa
e sua expansão por grande parte da Europa Ocidental.
A consolidação
econômica e administrativa da obra revolucionária
Sob Napoleão Bonaparte, a obra econômica,
jurídica e administrativa da Revolução Francesa ficou consolidada. No entanto,
esse fato ocorreu acompanhado da supressão do principal objetivo político da
Revolução – a criação de um regime representativo fundamentado no liberalismo.
Com efeito, Napoleão chefiou um Estado autocrático, ainda que disfarçado com
instituições liberais, onde o governante possuía tanto ou mais poderes do que o
antigo absolutismo. Foi, na prática, uma ditadura militar que afirmava
representar os interesses nacionais e revolucionários – uma autocracia em nome
da Nação. Em um primeiro momento (1799-1804), o Estado napoleônico assumiu a
forma de uma república (o Consulado) e em outro de uma monarquia (o Império, 1804-1815).
A expansão da
obra revolucionária
Resultado dos triunfos militares da França
napoleônica na guerra contra as coligações antifrancesas – um episódio, o mais
decisivo, da velha ambição dos dirigentes franceses de estabelecer a hegemonia
na Europa. Com efeito, o que tornou esse capítulo das tradicionais disputas
hegemônicas europeias especialmente importante e distinto dos anteriores foi o
fato da revolução ter criado uma nova base para o poder militar da França – a
mobilização do seu potencial humano em nome do nacionalismo e a modernização da
sua infraestrutura e exército – e estar o país sob o comando de um dos maiores
gênios militares da história. Com sua extraordinária capacidade de improviso,
seu senso de oportunismo e sua audácia, Napoleão dirigiu as tropas francesas em
uma série de vitórias entre 1799 e 1812. O resultado foi a criação de um império
europeu, com anexação de territórios, criação de países-satélites e
subordinação de reinos à liderança da França. Nas áreas diretamente administradas
pelos franceses foram feitas reformas inspiradas na Revolução que destruíram os
antigos regimes locais – a exportação e universalização da revolução
“burguesa”.
O projeto imperialista napoleônico, contudo,
fracassou por dois motivos principais: a resistência da Grã-Bretanha, alicerçada
em sua superioridade naval, financeira e industrial, que permitiu sustentar as
alianças contra Napoleão, e o custo de manutenção do império francês em uma
situação de guerra e de expansão de ideais nacionalistas, que esgotou os
recursos da França e de seus domínios. O império napoleônico foi destruído em
1813-1814 e a tentativa de restabelecê-lo em 1815 fracassou. Porém, os efeitos
ideológicos, políticos e econômicos da obra napoleônica dentro da França e na
Europa prolongaram-se até o século XX e mudaram para sempre a história do
Ocidente.
O CONSULADO (1799-1804)
Organização política
O Golpe do 18 Brumário encerrou a fase dos
governos revolucionários exclusivamente de civis. A república foi modificada e
transformada no Consulado, baseada em uma nova constituição, outorgada
em 1799 por uma comissão encabeçada por Napoleão, .Sieyés e Roger Ducos. O
poder executivo assumiu feições autoritárias, sendo encabeçado pelo Primeiro
Cônsul (Napoleão), auxiliado por outros dois cônsules e por um Conselho de
Estado. O legislativo era constituído pelo Senado (com membros apontados pelo
Primeiro Cônsul, que junto com ele elaborava as leis) e pelo Corpo Legislativo
(votava a legislação mas não a discutia). Em maio de 1802, Napoleão tornou-se
Cônsul Vitalício por meio de um plebiscito.
A reforma administrativa
Grande parte da obra administrativa do
Consulado napoleônico foi criada ou prevista pelo Diretório mas foi Napoleão
quem a pôs em prática, dando-lhe um aspecto mais autoritário, centralizador e
hierarquizado.
Fim da autonomia das administrações locais. Os
administradores dos departamentos, distritos e comunas passaram a ser escolhidos
pelo governo central.
Reorganização financeira. Criação do
Banco da França (fevereiro 1800) e de uma nova moeda, o franco; reorganização
do sistema tributário, que ficou mais eficiente.
Centralização do judiciário.
Fortalecimento do aparato policial e
repressor.
Censura, criação de um serviço secreto com uma rede de informação e espionagem,
prisão e execução de monarquistas e jacobinos.
Concordata de 1801. Acordo com a
Igreja Católica (papa Pio VII), que continuou separada do Estado. O governo
nomeava os bispos e o papa os investia, o clero receberia salários do Estado e
juraria fidelidade a ele.
Reforma educacional. O ensino foi
transformado em serviço público, enfatizando-se a formação de funcionários e
técnicos para a burocracia do Estado, que foi ampliada e modernizada.
O Código Civil ou Napoleônico (1804). Foi a
principal obra de Napoleão. Institucionalizou e consolidou as reformas do
regime revolucionário: garantia da liberdade individual e da propriedade
privada, igualdade diante da lei, direito ao divórcio etc.
A guerra (1799-1802)
Napoleão assumiu a direção da França no início
da Guerra da Segunda Coalizão contra a Grã-Bretanha, a Áustria e o
Império Turco (a Rússia havia saído em outubro de 1799 por desavenças com os
britânicos). Em 1800, o exército francês derrotou seus adversários na Itália (Batalha
de Marengo, junho) e na Alemanha (Batalha de Hohenlinden, dezembro),
forçando a Áustria a aceitar a paz. Embora os britânicos e turcos tenham
reconquistado o Egito em 1801 (onde Napoleão havia deixado um exército na
invasão de 1798), a Grã-Bretanha também buscou um acordo com a França. Em 1802,
os dois países assinaram o Tratado de Amiens, que na prática foi uma
trégua entre ambos.
Os domínios franceses e a retomada da guerra
contra a Grã-Bretanha (1803)
Com a Paz de Amiens, Napoleão teve a
oportunidade de reorganizar os territórios controlados pela França e introduzir
neles uma série de reformas. A Itália foi o principal alvo dessa
reorganização, com a criação de República Cisalpina, na parte norte do
país, presidida pelo próprio Napoleão. Os Estados Papais foram restabelecidos,
ainda que reduzidos. Mas as tensões com a Grã-Bretanha retornaram quando
Napoleão tentou restabelecer um império colonial na América e impôs tarifas
protecionistas nas áreas ocupadas. Os britânicos responderam com um bloqueio
comercial e as hostilidades retornaram (maio 1803). Napoleão começou a preparar
uma invasão da Grã-Bretanha, concentrando forças no Canal da Mancha e no Mar do
Norte. Os britânicos passaram a articular uma nova coligação contra a França.
O IMPÉRIO (1804-1814)
A popularidade e prestígio de Napoleão
obtidos com a recuperação econômica da França e os sucessos militares, a fraqueza
da oposição e o controle do exército criaram um contexto favorável ao
estabelecimento de um poder absoluto napoleônico, visto como necessário para
enfrentar a Grã-Bretanha e continuar o expansionismo francês. Sob o pretexto de
enfrentar uma (falsa) conspiração monarquista, Napoleão conseguiu mudar o
regime por meio de um plebiscito, em 1804. A França voltou a ser uma monarquia,
agora com o nome de Império e, em dezembro, Napoleão foi coroado imperador
Napoleão I. Foi também criada uma nova nobreza com a distribuição de títulos
hereditários, sobretudo para os seus familiares.
A guerra generalizada e a expansão francesa
Em 1805-1809, a França napoleônica
derrotou três novas coligações organizadas pela Grã-Bretanha e ampliou os
domínios franceses. Na Guerra da Terceira Coligação (1805), os franceses
venceram as batalhas de Ulm e Austerlitz na Alemanha, levando a
Áustria a abandonar a aliança anti-francesa. Mas a França e a Espanha, sua
aliada na ocasião, foram derrotadas pela Grã-Bretanha na Batalha de
Trafalgar (outubro 1805), um confronto naval decisivo que destruiu a
marinha francesa e deixou os britânicos senhores incontestáveis dos mares.
Contudo, a superioridade terrestre da França continuou e aumentou nos anos
seguintes. Na Guerra da Quarta Coligação (1806-1807) a Prússia foi derrotada
na Batalha de Jena (1806), deixando a Alemanha sob o controle de
Napoleão (Paz de Tilsit, 1807). A Áustria entrou novamente na luta contra a
França mas foi outra vez derrotada na Batalha de Wagran na Guerra da
Quinta Coligação (1809), reafirmando a preeminência francesa na Europa.
Áustria, Prússia e Rússia preservaram sua independência (a Prússia mutilada)
mas tiveram que reconhecer a hegemonia da França. A Grã-Bretanha, com a
supremacia naval, continuou enfrentando os franceses sem descanso.
O império napoleônico na Europa
Baseava-se em territórios anexados, em reinos
encabeçados pela família Bonaparte, em Estados-satélites e em países aliados (o
sistema continental). O sistema jurídico-político francês foi implantado na
áreas diretamente dominadas (eliminação do feudalismo, dos direitos senhoriais
e dos dízimos, aplicação do Código Napoleônico etc). Visando quebrar a
resistência britânica e dominar o mercado europeu, Napoleão decretou o Bloqueio
Continental (1807), proibindo a Europa de praticar comércio com a
Grã-Bretanha. Os países que não obedecessem ao Bloqueio seriam atacados, como
Portugal (1807).
Problemas do
império napoleônico
O projeto napoleônico de um sistema
continental que possibilitasse o domínio francês na Europa fracassou. As razões
gerais disso foram apontadas acima. Associadas a elas podemos destacar:
Os limites da economia francesa. A França não
possuía a capacidade industrial, financeira, comercial e competitiva da
Grã-Bretanha e não podia suprir as necessidades de consumo do continente. Além
do mais as guerras com os britânicos (que também havia estabelecido um bloqueio
naval contra a França) cortavam o fornecimento de matérias-primas e geravam
escassez.
A Revolta Espanhola
(1808-1813). Objetivando garantir o controle francês sobre a
Península Ibérica e isolá-la da Grã-Bretanha, os franceses invadiram Portugal
(1807) e a Espanha (1808). Napoleão forçou a abdicação do rei espanhol Fernando
VII e colocou no trono espanhol seu próprio irmão, José Bonaparte (maio, 1808).
Isso desencadeou uma grande revolta popular, apoiada pelos britânicos, que
invadiram Portugal. A chamada Guerra Peninsular (britânicos, espanhóis e
portugueses contra franceses) estendeu-se até o final do governo de Napoleão,
desviando recursos e soldados de outras partes do Império napoleônico.
A campanha da Rússia (1812). Em meio as
dificuldades na Península Ibérica, Napoleão invadiu a Rússia. O czar Alexandre
I rompeu o Bloqueio Continental, aumentando a tensão entre Rússia e França,
agravada pelos interesses divergentes sobre o futuro da Polônia. Napoleão
organizou um gigantesco exército de contingentes de todo o império – a Grande
Armée, com 650 mil homens – e invadiu a Rússia, em junho de 1812. A campanha foi um
desastre, apesar das vitórias francesas nas batalhas de Smolensk (agosto)
e Borodino (setembro) e da ocupação de Moscou (setembro-outubro). A
principal razão disso foram os problemas de logística – as dificuldades com as
distâncias e os suprimentos das tropas. O inverno rigoroso, a resistência e
táticas dos russos (destruição da terra para não fornecer recursos para os
invasores) pioraram a situação, obrigando a retirada do exército francês
(outubro). Quando ele atingiu a fronteira da Prússia, restavam menos de 30 mil
soldados – a maior parte tinha morrido de frio e de fome, foi capturada ou
simplesmente fugiu. Os russos chamaram a campanha de “Grande Guerra Patriótica”
e o seu comandante, o general Kutuzov, foi transformado em herói nacional.
A nova coalizão contra a França (1812-1814). A França não
conseguiu se recuperar da catástrofe na Rússia, favorecendo o crescimento da
resistência e oposição aos franceses. Além da Rússia, a Prússia (1812) e a
Áustria (1813) novamente se juntaram a Grã-Bretanha para enfrentar uma França
enfraquecida. Depois da derrota francesa na Batalha de Leipzig (outubro
1813), o desmoronamento do império napoleônico se tornou irreversível.
A queda de Napoleão (1814)
No início de 1814, a França foi invadida
e a Coalizão tomou Paris no final de março. Sem condições de oferecer uma
resistência eficaz e pressionado pelo exército, Napoleão abdicou (abril) e
exilou-se na ilha de Elba, transformada em seu principado.
O GOVERNO DOS CEM DIAS (MARÇO-JUNHO 1815)
Com a queda de Napoleão, a Coalizão restaurou
a dinastia Bourbon no trono francês, entregando a Coroa para o rei Luis
XVIII (irmão de Luis XVI). Mas, em março de 1815, enquanto os vitoriosos
reuniam-se no Congresso de Viena para decidir o futuro da Europa, Napoleão saiu
de Elba, desembarcou na França e reassumiu o poder com o apoio dos seus
partidários, sobretudo dos soldados. Luis XVIII fugiu do país. Os britânicos,
holandeses e prussianos, então, concentraram suas forças na Bélgica para invadir
a França, enquanto os austríacos avançavam pela Itália e os russos pela
Alemanha. Napoleão resolveu tomar a ofensiva e atacar primeiro a ameaça mais
próxima: os exércitos aliados na Bélgica. Em meados de junho Napoleão invadiu a
Bélgica e, no dia 18, suas forças enfrentaram os britânicos (general Wellington)
e os prussianos (general Blücher) na Batalha de Waterloo. Os
franceses, porém, foram derrotados e Napoleão retornou para a França, com as
forças aliadas em seu encalço. Em julho, a Coalizão entrou novamente em Paris e
Napoleão acabou se entregando aos britânicos, depois de abdicar. Foi exilado na
ilha de Santa Helena, uma pequena colônia britânica no meio do Atlântico Sul, e
lá, sob uma rigorosa vigilância, passou os seus últimos anos de vida, morrendo
em 1821.
BIBLIOGRAFIA
BLANNING, Timothy C.
W. Aristocratas Versus Burgueses? A Revolução Francesa.
São Paulo, Ática, 1991. Excelente
introdução revisionista das concepções tradicionais da Revolução Francesa.
GODECHOT, Jacques. As Revoluções (1770-1799). São
Paulo, Pioneira, 1976. Manual
universitário de excelente nível, contextualizando a Revolução Americana e a
Revolução Francesa no quadro geral da Revolução Ocidental.
GODECHOT, Jacques. Europa e América no Tempo de Napoleão (1800-1815). São
Paulo, Pioneira, 1984. Continuação da obra
anterior, mantendo o mesmo nível de erudição e excelência.
HOBSBAWM, Eric J. A Era das Revoluções 1789-1848.
São Paulo, Paz e Terra, 1982. Famosa interpretação marxista da “Dupla
Revolução” (Revolução Francesa e Revolução Industrial) e seus desdobramentos na
formação do mundo contemporâneo.
SOBOUL, Albert. História da Revolução Francesa.
Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1981. A interpretação clássica da Revolução
Francesa como uma revolução burguesa e popular.
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