terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

11 - Revolta e revolução




Pessoal, no ano passado (Primeira Série do Ensino Médio) nós utilizamos alguns conceitos básicos no estudo das sociedades antigas e medievais, como CIVILIZAÇÃO, ESTADO, GOVERNO, CIDADANIA, TRABALHO COMPULSÓRIO, ESCRAVIDÃO e SERVIDÃO. Nesse ano (Segunda Série), além desses conceitos já vistos, vamos utilizar outros, como PODER, HEGEMONIA, ELITES, REVOLUÇÃO e REVOLTA. Segue abaixo uma pequena definição desses termos:

PODER

Poder é a capacidade que um Estado, organização, grupo social ou indivíduo tem de, utilizando determinados recursos, alcançar um objetivo desejado, mesmo que isso contrarie interesses de outras pessoas. No interior de uma sociedade ou na relação entre sociedades diferentes, o poder implica em impor algo a outro: ele é uma relação entre entidades dominantes e dominadas, rivais ou aliadas. O poder nunca é estático e pode ser ampliado, reduzido ou eliminado. Quem possui e exerce poder é uma potência.

TIPOS DE PODER. O poder pode ser dividido em diversos tipos ou redes, destacando-se quatro: o poder econômico (controle das riquezas e tecnologia), o poder político (capacidade de governar a sociedade ou de participar do governo, exercida pelas elites dirigentes, burocracia e partidos), o poder militar (uso da força armada, em geral pelo Estado, mas também por grupos independentes do Estado, como organizações revolucionárias e criminosas) e o poder ideológico (controle das ideias e capacidade de impor crenças). Com efeito, o uso da força (militar, econômica) ou a manipulação política não são necessariamente os únicos instrumentos de exercício do poder. Na verdade, a manutenção do poder muitas vezes também depende de mecanismos ideológicos: os valores e concepções da realidade de um grupo social ou de uma organização política ou religiosa podem persuadir outros setores da sociedade a identificar os seus interesses com os dos mais poderosos, legitimando a dominação ou a liderança de um grupo sobre os demais. Além disso, alguns interesses econômicos e políticos comuns podem levar as pessoas a apoiar ou colaborar com o poder do grupo dominante.

HEGEMONIA.Hegemonia (do grego hegemonia ou “direção”, “proeminência”), é um conceito fundamental nos estudos sobre o poder. O termo é usado nas ciências humanas como sinônimo de supremacia, predominância, liderança ou influência preponderante de uma entidade sobre outras. Assim, no sentido da política interna de um país, podemos falar da hegemonia de um grupo, partido ou classe sobre a sociedade, em geral acompanhada pelo controle do aparelho de Estado. Podemos também falar em hegemonia de uma ideia ou de uma doutrina na cultura de um povo, como a que norteia os seus valores, a sua política ou o seu sistema educacional, influenciando a formação individual. Já nas relações internacionais, podemos falar da hegemonia de uma grande potência sobre o conjunto dos outros países, inclusive sobre outras grandes potências. Nesse caso, queremos dizer que em um sistema de Estados um deles é hegemônico, ou seja, que uma determinada ordem internacional é caracterizada pela supremacia econômica ou militar de uma potência sobre as demais.

O PODER DAS ELITES. Quem de fato detém o poder de comando da sociedade? Uma importante corrente da Sociologia e da Ciência Política que tenta responder essa questão é a teoria das elites ou elitismo, representada por Vilfredo Pareto (1848-1923), Gaetano Mosca (1858-1941) e Robert Michels (1876-1936). Qualquer organização econômica, política ou religiosa, naturalmente, possuiu uma elite ou minoria que se destaca pelas suas qualidades especiais como conhecimento e prestígio ou pelos cargos que ocupa nessas organizações. Partindo desse princípio, a teoria das elites afirma que as sociedades, mesmo aquelas com regimes democráticos, são sempre dominadas por uma minoria ou elite em razão dela possuir determinados recursos e atributos, que podem ser econômicos ou não (melhor capacidade de organização, mais conhecimento, força militar, legitimação ideológica, prestígio). A inevitabilidade do governo das elites levou Michels a afirmar a existência de uma "lei de ferro da oligarquia": a democracia exige organização e a organização pressupõe a existência de uma elite dirigente ou oligarquia. As elites que detém o poder político podem também deter o poder econômico, o poder ideológico ou o poder militar ou uma combinação deles, mas não há uma regra quanto a isso. A elite política dirigente pode ser distinta da elite econômica, ainda que exista, como geralmente acontece, algum tipo de associação ou aliança entre elas para preservar a ordem social. Com efeito, a teoria das elites destaca a manipulação das massas pelas elites políticas por meio de mecanismos ideológicos que legitimam sua dominação, inclusive nas democracias. As elites dirigentes, contudo, não formam necessariamente um grupo coeso e nem mantém permanentemente o poder político. Elas podem ficar divididas por questões ideológicas e facções rivais, e outras elites podem surgir entre os grupos dominados. As elites dirigentes podem ser substituídas por novas elites em processos violentos (revoluções, guerras civis, golpes de Estado) ou pacíficos (eleições), mas a sociedade continuará dominada por uma minoria que detém o poder.

CONFLITO POLÍTICO

O conflito político é uma luta pelo poder entre forças rivais. Quando ocorrido no interior de uma sociedade, ele envolve a luta pelo controle do Estado, pela participação política ou para pressionar o governo a fazer reformas que ele resiste em aplicar. O conflito político pode ser violento ou pacífico. Durante a maior parte da história, a disputa pelo poder foi um processo violento, envolvendo derrubadas de governos, confrontos armados, massacres, eliminação e prisão de rivais. Nas sociedades modernas mais avançadas e amadurecidas, a violência dos conflitos políticos foi drasticamente reduzida, sobretudo a partir da segunda metade do século XX.  A disputa pacífica pelo poder no interior de uma sociedade, mobilizando amplos segmentos sociais num quadro de legalidade, respeito às instituições, tolerância e debate público, é considerada uma prática normal nos regimes democráticos. Embora esse tipo de disputa tenha ocorrido de forma limitada e por algum tempo na Grécia e em Roma na Idade Antiga, ela é um fenômeno relativamente recente, estabelecida nos Estados inspirados no liberalismo. Quando ocorre de forma violenta, o conflito político assume diversas modalidades: golpe de Estado, revolução, contrarrevolução, revolta e guerra civil.

GOLPE DE ESTADO. Também conhecido pelos termos francês coup d’État e alemão putsch, o golpe de Estado é a destituição de um governo por opositores ou a alteração de um regime político pelo próprio governante por meio da força ou de meios inconstitucionais. Todo golpe de Estado bem-sucedido, mesmo quando dirigido por civis, conta com a participação ou o respaldo de militares, necessária para reprimir a resistência aos golpistas. De fato, historicamente a maioria dos golpes de Estado que triunfou foi liderada por militares que romperam com a ordem política vigente.

REVOLUÇÃO. Revolução é uma mudança relativamente rápida e profunda nas estruturas de uma sociedade. Grosso modo, as revoluções podem ser divididas em quatro tipos genéricos, que muitas vezes estão associados: a revolução política, a revolução social, a revolução econômica e a revolução cultural. A revolução política é uma mudança intencional e súbita do regime político e da organização do Estado, refletindo a ascensão ao poder de novas elites ou de elites dissidentes (parte da elite dirigente tradicional que rompeu com o antigo regime). A revolução política pode ocorrer de forma violenta (fruto de uma insurreição ou de um golpe de Estado, por exemplo) ou de forma pacífica (como em eleições em uma democracia ou em movimentos populares de desobediência civil). A revolução política muda o regime político mas não muda necessariamente a estrutura econômica e social (a organização da sociedade, as formas de trabalho, os direitos de propriedade, a distribuição das riquezas). A revolução econômica, por sua vez, é uma transformação relativamente rápida no modo de produção das riquezas, implicando no estabelecimento de novas técnicas, das formas de trabalho e da divisão de trabalho. Já a revolução cultural é uma mudança radical dos valores, costumes e ideologia predominantes. Quando a revolução política é acompanhada de mudanças profundas na sociedade ela é chamada de revolução social. A revolução social resulta, simultaneamente, em um novo regime político, em uma nova sociedade e uma nova economia, respaldadas por uma nova ideologia (uma nova visão de mundo ou de interpretação da realidade) que legitima as mudanças na organização do Estado e nas relações econômicas e sociais (alteração nos direitos políticos e de propriedade, nas formas de trabalho, na distribuição de riquezas). Em geral, em razão das profundas mudanças que ela pretende ou ameaça gerar no poder político, no poder econômico e nas relações no interior da sociedade, a revolução social é violenta – uma violência que parte tanto dos grupos interessados nas mudanças revolucionárias quanto dos grupos contrários a elas. Em alguns casos, a revolução social é feita e liderada pelo próprio governo, com respaldo de parte das elites dominantes, interessadas em modernizar a sociedade e a economia (por exemplo, com a industrialização rápida), preservando, porém, o poder em suas mãos. Essa modalidade de revolução social é chamada de revolução pelo alto. A Revolução Meiji no Japão (1868), que resultou na abolição do feudalismo e dos exércitos samurais, na industrialização, na modernização militar e na criação de uma monarquia constitucional e de uma sociedade capitalista, é um exemplo de uma revolução pelo alto. Mas a maioria das revoluções sociais é da modalidade chamada de revolução por baixo, caracterizada pela mobilização popular, quer dizer, pela ação das massas de trabalhadores até então excluídas do governo, lideradas por uma elite revolucionária que toma o poder dos grupos dirigentes. A revolução social por baixo é guiada pelo ideal de construção de um novo regime político e de uma nova sociedade considerada melhor e mais justa do que a anterior. Foram os casos notórios da Revolução Francesa (1789), da Revolução Russa (1917), da Revolução Chinesa (1949) e da Revolução Cubana (1959). A revolução social, portanto, é a combinação da revolução política com a revolução econômica e a revolução cultural, transformando a organização do Estado, a estrutura de classes, o modo de produção e a ideologia dominante. Nesse sentido, não há consenso entre os historiadores a respeito do tipo de revolução (política ou social?) que caracterizou a Revolução Puritana (1640) e a Revolução Gloriosa (1688) – ambas na Inglaterra  – e a  Revolução Americana (1776).

REVOLUÇÃO BURGUESA. Revolução burguesa é a revolução política ou revolução social que cria um Estado com instituições e leis favoráveis ao desenvolvimento do capitalismo. Em geral, ela é identificada com a revolução liberal, quer dizer, com uma revolução inspirada nos valores do liberalismo e no estabelecimento de um regime liberal (direitos naturais do indivíduo, como vida, propriedade privada e liberdade; ideal de cidadania, assegurando esses direitos e deveres; isonomia ou igualdade dos cidadãos diante da lei; governo eleito constitucional limitado pela lei; tolerância ideológica e liberdade de expressão; liberdade econômica com pouca intervenção estatal no capitalismo).

CONTRARREVOLUÇÃO. A contrarrevolução é o movimento de enfrentamento de uma revolução política ou de uma revolução social que pode ocorrer antes ou durante o processo revolucionário. Ela pode ser a intensificação de medidas governamentais repressivas e de controle social para impedir a eclosão de uma revolução, especialmente em um contexto de crise econômica e política que ameaça a ordem tradicional. Contudo, a contrarrevolução é mais comum durante o processo revolucionário, quando ela é caracterizada pelas ações reacionárias do governo e dos grupos dirigentes que lutam para preservar o poder. Depois da conclusão da revolução, a contrarrevolução passa a ser um outro movimento – o movimento pela restauração do antigo regime e da ordem social anterior.

REVOLTA. A revolta, também chamada de rebelião, é uma manifestação coletiva contra as autoridades e a ordem vigente. Ela é distinta da revolução política. Uma revolta pode se transformar em uma revolução mas, em geral, ela é um acontecimento mais limitado em seus objetivos. A revolta é mais localizada, sua motivação ideológica é muitas vezes ausente e ela reivindica medidas políticas ou econômicas imediatas que não implicam em transformar total ou radicalmente a ordem vigente – ao contrário, uma revolta pode ser desencadeada para forçar o governo a aplicar a lei ou restaurar algum direito abolido. A rebelião pode estourar espontaneamente em razão do descontentamento de algum setor da sociedade, inclusive de militares (nesse caso a revolta contra os superiores hierárquicos é chamada de motim), mas também pode ser resultado de um planejamento ou conspiração, acompanhada de uma insurreição (levante armado). A revolta termina com os rebeldes sendo reprimidos ou anistiados pelo Estado, ou com suas reivindicações atendidas.

GUERRA CIVIL. A guerra civil é a modalidade mais extrema de luta pelo poder no interior da sociedade. Ela é o conflito armado dentro de um país entre grupos rivais, deixando a sociedade radicalmente dividida (uma guerra doméstica ou fratricida). Nas revoluções políticas e sociais, a guerra civil é caracterizada pela luta entre revolucionários e contrarrevolucionários.

Bibliografia:

DEFRONZO, James. Revolutions and Revolutionary Movements. Philadelphia: Westview, 2011.

MALIA, Martin. History's Locomotives  – Revolutions and the Making of the Modern World. New Haven: Yale, 2006.

PARKER, Noel. Revolutions and History. Cambridge: Polity Press, 1999.

SKOCPOL, Theda. States and Social Revolutions. Nova York, Cambridge, 1979
 
 

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